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Raí explica como São Paulo de 1992 era à frente do tempo graças ao visionário Telê Santana: 'Resgate do futebol brasileiro' 662w38

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Raí diz que São Paulo de Telê Santana protagonizou o 'resgate' do futebol brasileiro no Mundial de 1992: 'A seleção não ganhava desde 1970' (1:14)

Raí foi o quarto entrevistado do especial 'Papo de Mundial' (1:14)

Ao contrário do que acontece hoje em dia, os clubes brasileiros aram décadas sem priorizar a CONMEBOL Libertadores (o que os impedia de disputar o título mundial, na época apenas contra o campeão europeu). Quem ajudou a mudar tal perspectiva foi o lendário São Paulo de 1992, que marcou a história ao ganhar o torneio continental e, meses depois, ir ao topo do mundo ao superar o Barcelona, em final direta no Japão, por 2 a 1.

O grande nome daquela decisão em Tóquio foi Raí, autor dos dois gols que deram a virada e o título inédito ao Tricolor. O capitão e camisa 10 da equipe é apenas a cereja do bolo de um time que tinha nomes como como Zetti, Cafu, Müller e Palhinha, mas não são as estrelas que fazem aquela equipe ser lembrada até hoje.

Quarto convidado do "Papo de Mundial", programa da ESPN que reúne histórias sobre o torneio interclubes, Raí contou detalhes de como era fazer parte daquele São Paulo, uma equipe que, sob o comando de Telê Santana, ajudou a resgatar o futebol brasileiro com um estilo, na sua visão, inovador.

“Era uma maneira de jogar muito à frente do seu tempo. Não sou muito de ver retrospectivas, mas quando você vê as jogadas, dá para perceber que era um time ofensivo, com algumas jogadas em que tinha muita troca de posições, tinha uma modernidade. O Telê, como um visionário, sabia adaptar o estilo dos jogadores e tirar o seu máximo”, disse.

“Quando o Telê chegou, por exemplo, eu era um jogador mais de armação, mas ei a fazer mais gols, ser mais completo. E foi uma coisa construída, os movimentos foram construídos até se tornar algo automático. Acho que essa era a grande diferença, além de ter grandes jogadores. Mas ao mesmo tempo tinha um esquema diferente que surpreendia os outros. O Barcelona tinha um esquema om menos troca de posições, um pouco mais previsível que o nosso”, completou.

Naquela final, em dezembro de 1992, Stoichkov abriu o placar com um chute no ângulo direito de Zetti. Após minutos até irreconhecíveis, o São Paulo ou a dominar o jogo. Raí empatou ainda no primeiro tempo, ao completar jogada individual de Müller pela esquerda. A virada foi com um gol ainda mais bonito. De falta, em jogada ensaiada com Cafu, o meia botou a bola na gaveta de Zubizarreta e correu para abraçar Telê Santana no banco.

O ex-camisa 10 conta que não teve noção de seu feito até poucos dias depois. A ficha só caiu graças a um chacoalhão de um companheiro.

“Teve um momento engraçado poucos dias depois, quando a gente chegou (no Brasil). O Pintado me balançou como se tivesse me acordando e gritava: ‘Olha o gol que você fez’. Quer dizer, não foi qualquer gol, o jeito que foi, onde a bola entrou”, contou Raí.

“Ali ele me acordou e eu pensei: parece que eu entrei para a história. A gente estava vibrando, vale tudo, mas teve um plus que foi a beleza do gol, que representou o trabalho de todo aquele time. Tanto é que na hora que eu faço o gol, todo mundo corre até o Telê. Eu acho que a ficha não tinha caído, o Pintado sacudiu para a ficha cair (risos)”, falou.

A conquista do São Paulo foi importantíssima para o clube, mas também para o futebol brasileiro. Para Raí, o estilo de jogo somado aos anos sem conquistas mundiais da seleção fizeram com que o Intercontinental de 1992 ganhasse uma proporção ainda maior.

“Vendo agora com a distância, foi um resgate do futebol brasileiro. Porque o Flamengo, dez anos antes, tinha conquistado o Mundial, a seleção não ganhava desde 1970… Estava há muito tempo (sem ganhar)”, ressaltou.

“O que eu percebo naquela conquista é que o Brasil inteiro acompanhou, os são-paulinos obviamente vibraram, mas torcedores de outros times até aqui de São Paulo e o Brasil inteiro vibrou, acompanhou. Até porque era um jogo bonito, a essência do futebol brasileiro: um jogo eficiente e com beleza, com harmonia, com um idealismo que vinha do Telê Santana e acabou resgatando a alma do futebol brasileiro a nível internacional”, continuou.

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Raí diz o que São Paulo tinha de 'diferente' para bater o Barcelona no Mundial de 1992: 'Eles tinham um esquema diferente, mas um pouco mais previsível'

Raí foi o quarto entrevistado do especial 'Papo de Mundial'

O idealismo de Telê u451u

A mente por trás daquele São Paulo multicampeão era Telê Santana, apontado por muitos como um dos maiores treinadores da história do futebol brasileiro. Raí, escolhido a dedo para ser seu capitão, citou como seu idealismo o fez eternizar seus times na história.

“Para ele não bastava vencer, tinha que vencer de uma maneira que convencia, como ele pensava que deveria ser o futebol. Isso ia até a qualidade da grama nos treinamentos, o jogador poderia ser um craque, mas melhorar os seus fundamentos. Esse era o diferencial; tem muitos treinadores teóricos, Telê era muito do treinamento. E quando a gente percebia, três meses depois estávamos fazendo de maneira muito automática”, relembrou.

“Sempre digo que o diferencial dele eram dois: além de ser um gênio, tinha a paixão pelo jogo bem jogado, a estética, o idealismo e fazer com que os jogadores tivessem o prazer do jogo coletivo. Não é só o esquema, ele fazia com que cada atleta tivesse mais prazer com uma jogada coletiva do que individual”, acrescentou.

Anos depois do fim de sua carreira e até mesmo de sua morte, o Mestre Telê é lembrado até hoje como um dos últimos gênios do futebol brasileiro. Questionado sobre a possibilidade de um treinador semelhante surgir em um futuro próximo, Raí fez uma análise sobre os problemas da formação de técnicos no Brasil.

“Um Telê Santana é raro e surge de tempos em tempos. Ele pode simbolizar um pouco a nossa baixa de rendimento do futebol brasileiro com relação a outros países. Logo depois do Telê, eu fui para a França, acompanhei o quanto era investido em Portugal, na França…”, avaliou.

“Percebi que tinha muito investimento na formação de treinadores. Um gênio surge a cada 10, 20, 30 anos… agora, se você investe na formação qualificada de treinadores, a chance de surgir acaba sendo muito maior”, seguiu.

“Acho que o Brasil pecou, está tentando correr atrás, a CBF investe em um curso que ainda não é reconhecido internacionalmente. Acho que falar do Telê Santana, falar de grandes treinadores, o Brasil tem, mas não o suficiente para o tamanho que o potencial do futebol brasileiro tem”, finalizou.

Veja o episódio completo do "Papo de Mundial" com Raí: 1w4z3n